sábado, 15 de setembro de 2018

As crianças de agora não veem nada de jeito? Têm a certeza? (Parte 2)

Olá a todos. Hoje, seguimos com aquilo a que eu chamo a minha defesa das crianças de agora quando as acusam de não verem nada de jeito. A primeira parte desse texto está aqui, mas se bem se lembram, tínhamos deixado no ar esta dúvida: as pessoas que defendem essa ideia defendem-na por acharem que já não existem canais que dão atenção às crianças? Ou uma ideia semelhante?

Ora bem, se de facto há quem ache que as crianças já não veem nada de jeito por não existirem canais dedicados a elas, também não me parece que isso faça muito sentido. Mas primeiro pensemos no que leva alguém a pensar assim. Será que pensam que os canais mais clássicos (RTP, SIC e TVI?) já não lhes prestam atenção? É uma possibilidade. Afinal, para alguns, é possível que o simples facto de o Dragon Ball já não passar na SIC seja suficiente para afirmar isso. E, note-se, já vi uma pessoa usar um argumento para alegar que os canais já não queriam educar os mais novos que consistia no seguinte: (parafraseando) “A Rua Sésamo passava no horário em que atualmente passam os Morangos com Açúcar.”. Interessante. De facto, assim, parece que temos uma prova contundente. Mas…teremos? Tenho as minhas dúvidas.

Eu não presto porque não estou à procura de 7 bolas de cristal?
Repete, se tens coragem!

Antes de mais, duvido seriamente que no meu tempo (por exemplo) existissem mais canais com os kids in mind do que atualmente. É que no meu tempo, a televisão por cabo ainda era um pouco uma novidade. E por muito que seja um pouco injusto considerar a televisão por cabo como algo que toda a gente tem atualmente – é uma generalização abusiva que discrimina um pouco os cidadãos com menos recursos –, partamos do princípio que 4 em cada 5 crianças têm acesso à televisão por cabo (ou TDT, se a expressão se adequar) atualmente. Quem tem mais opções, as crianças de agora ou as de décadas anteriores? Suspeito que seja o primeiro grupo…senão vejamos: uma criança com acesso à atual panóplia de canais que os pacotes de canais oferecerem tem acesso a muitos dos seguintes canais com os kids in mind:
Baby First
Canal Panda
Cartoon Network
Disney Channel
Disney Junior
Nick Jr. Channel
Nickelodeon
Panda Biggs
Sic K
Super RTL
Tiji

Lista grandinha, não? E agora, pergunto eu, esta oferta toda algum dia se compara à oferta dos famosos 4 canais? Quer dizer, temos aqui uma lista como esta de canais que são literalmente feitos para uma audiência infantojuvenil. Que hipóteses têm os 4 canais, ainda para mais sabendo que esses também têm dezenas de programas para adultos? Alguns dos quais as crianças não podem ver, note-se…(refiro-me àqueles com a circunferência vermelha no cantinho). E, volto a frisar, no meu tempo não havia Panda Biggs. Nem Disney Junior…enfim, acho que se percebe que as crianças agora têm tendência a ter uma oferta incomparavelmente maior do que a que teriam há uns anos.

Há ainda outro pormenor/“pormaior” que importa sublinhar: o próprio Cartoon Network, que já existia quando a televisão por cabo ainda era uma novidade, estava longe de ser tão acessível às crianças como é agora. Porquê? Porque praticamente todos os desenhos animados que lá passavam estavam em inglês. Em inglês sem legendas! Era só as personagens a falar inglês sem qualquer tipo de auxílio para uma criança perceber o que se estava a dizer. Em contraste com o que acontece neste momento, em que praticamente tudo o que é programa que passa no CN aparece com uma caprichada dobragem portuguesa. Ah, pois é. Se gostam ou não da dobragem é outra história; podem sempre não gostar…ainda que tenham uma variedade considerável. Afinal, têm dobragens com equipas de dobradores mais modernas e têm outras com equipas de dobradores clássicas. A dobragem portuguesa que o CN usa d’O Laboratório do Dexter, por exemplo, é a mesma que eu ouvia quando era criança e os 4 canais passavam o nosso amigo Dexter (com vozes de Henrique Feist, Cristina Cavalinhos e outros).

- Ei, Dexter, não serás o Doofenschmirtz em pequeno?
- Estás a chamar-me anão de jardim? É por eu ser baixo?

Mas será que isto não chega para quem acha que as crianças de agora não veem nada de jeito? Será que, mesmo tendo tantos canais a pensar nos mais novos, têm de ser forçosamente os 4 canais a voltar a dedicar-se às crianças? Sei lá, com programas como Disney Kids, Batatoon e afins? Bom, aí tenho pouco a dizer; com efeito, que seja do meu conhecimento, esses programas não voltaram. Mas se a memória não me falha, nos anos 90 a RTP2 não tinha um Zig Zag a passar um número elevado de desenhos animados diferentes durante horas a fio.

Ou será que o, aham!, “problema” não são os 4 canais, mas sim a falta de programas específicos? Será que é a falta daqueles programas classicíssimos que cerca de 9 em cada 10 pessoa da minha geração está sempre a citar? É isso que falta? É que se é, eu pergunto genuinamente a quem pensar assim: fazem alguma ideia do quão esses desenhos animados têm andado a ser repostos? As reposições também contam, e nos últimos anos eu lembro-me (sem pensar muito) de terem sido repostos programas tão clássicos como Digimon – sim, o original! – e As Navegantes da Lua no Canal Panda e Dragon Ball na SIC Radical. E deve haver mais reposições assim, eu é que não estou a par de todas…mas como a nostalgia vende bem no geral, acho que é provável que haja pelo menos mais uma.

Uma crítica com poucas bases corre o risco
de se espalhar como um vírus mortal!

E nem me ponham a falar das outras formas que as crianças de agora têm para ver desenhos animados. É que o televisor é só uma hipótese; há mais hipóteses que, lá esta, não tinham sido inventadas nos anos 90. Estou a lembrar-me daquela piada recentemente proferida por José Diogo Quintela: “Ver televisão na televisão, que ideia tão parva!”…

Mas enfim, as minhas fórmulas para iniciar parágrafos estão a esgotar-se, por isso acho melhor a parte 2 ficar por aqui. Porém, este post é composto por 3 partes. Portanto, falta uma, pois…lá acabará por ser colocada. A próxima parte vai extravasar um pouco o mundo da televisão. Por isso não percam o próximo post…porque nós também não! XD

(continua na parte 3)

7 comentários:

  1. Legal seu blog!
    Esses dias estou falando sobre alguns desenhos antigos no meu blog também.
    Se puder, dê uma passada lá depois pra ver.
    Valeu!

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    1. Agradeço o elogio. E...eu até passo por esse blog para dar uma olhada, mas qual é o link? Ou o nome do blog?

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  2. (Parte 2)
    -”Eu não presto porque não estou à procura de 7 bolas de cristal?” Esta já é mais graciosa mas não é por ter um excerto gracioso que faz um desenho animado ter qualidade. É uma frase relativamente normal, mas seria improvável um desenho citar algo de outro desenho, até porque nesse desenho ele vivo num mundo à parte (tanto muito baseado no nosso) logo não iria dizer coisas de outros mundos. Mas também este tipo de citação é muito comum, a mim não mete graça pois já estou habituado.
    -A quantidade de canais não significa qualidade. Eu lembro-me quando era pequeno só existia um canal exclusivamente dedicado aos desenhos, o Panda, eu ficava todo contente por isto (eu só tinha SIC e RTP2 por causa duma antena doméstica) mas quando ia a casa de colegas que o tinham, odiava os desenhos de lá, os únicos que gostava já tinham passado ou na SIC ou na RTP2.
    -”Será que é a falta daqueles programas classicíssimos que cerca de 9 em cada 10 pessoa da minha geração está sempre a citar? “ Antes dava bons desenhos, agora não, ninguém pede que sejam repetidos mas sim que se faça algo com qualidade, que de vez em quando se faz como já exemplifiquei.
    -Deixou-se de repor nas televisões programas de grande qualidade, que têm muitos fãs, olha o Dartacão, Ana dos cabelos ruivos, Os Motorratos (enfim existem adaptações de alguns destes), Carrinha mágica (esta chegou a repetir no início de 2000), entre outros.

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    1. Continuando a parte 1...(já parece o posto outra vez, haha!):
      - A piada do Greninja a dizer aquilo das bolas de cristal, mais uma vez, não está no programa; fui eu que inventei. Nem sei esta temporada de Pokémon tem qualidade sequer, porque nem vi.
      - Completamente de acordo, qualidade não significa necessariamente qualidade. Mas, lá está, esta 2ª parte do post não fala exatamente de qualidade, fala mais de quantidade. A ideia é justamente contrariar o pensamento (sem grande lógica, acho) de que as crianças de agora têm MENOS oferta e/ou acesso de/a programas direcionados à sua faixa etária. Como escrevi mais ou menos neste post: como é possível comparar a antiga oferta dos 4 canais com a atual oferta de dezenas de canais, mais o que a Internet oferece e talvez até outros meios? Acho que é uma comparação que não funciona.
      - Certo, não se repõem na TV alguns programas bons como esses (embora o Dartacão seja colocado à venda em DVD de vez em quando), mas repõem-se outros como os que eu citei - e atenção que eu até me esqueci do Inspetor Gadget! Esse foi reposto aqui há uns anos...no Canal Panda, creio. E com o dobragem original. E a Carrinha Mágica já foi reposta tantas vezes (ok, talvez só duas!) que já ouvi esse programa com três dobragens diferentes. Três! Até me surpreende escrever...

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  3. Sem dúvida, hoje uma criança tem 1000x mais de oferta, mas a tal questão da qualidade...
    E também acho que é oferta a mais como tudo nesta vida! As coisas tornam-se muito mais especiais quando só acontecem uma vez por semana sei lá, era tão especial acordar aos sábados de manhã ansiosos pelos desenhos, hoje para quê acordar se tudo repete em vários canais diferentes a qualquer hora, ainda mais hoje podem gravar ou ir atrás no tempo!!! Bem nos 90 sei que dava para gravar nas cassetes mas eu não tinha vídeo!

    Atualmente já toda a gente deve ter acesso a mais de 4 canais, mas ainda há pouco tempo a maioria só tinha os 4, ou seja não tinham Canal Panda. Eu sinceramente deixei de ter televisão há já muitos anos, logo não estou a par das reposições, só me lembro de quando era pequeno, de quando ia a casa de colegas, o Panda repetiu As três Irmãs, a Carrinha, as Navegantes, por aí...

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    1. Pois, lá está, uma criança agora tem uma oferta bem maior. E claro, podemos questionar a qualidade dessa oferta, mas eu reservei a parte 2 deste post para me referir especificamente à quantidade. Para a qualidade, eu guardei mais a parte 1.
      Oferta a mais? Pois, acho que percebo...creio que há realmente essa tendência do ser humano para saborear com mais intensidade aquilo a que tem acesso com menos frequência. Suponho que é por isso que se diz que o melhor tempero é a fome, não é? A tal coisa de a comida saber melhor quanto mais fome se tem...nesse ponto em particular, Fernando, acho que as crianças de agora estão em desvantagem. Por comparação com as crianças de outros tempos, bem entendido.

      Eu não «sigo» propriamente as reposições que andam por aí, até porque se seguisse provavelmente teria mais exemplos além do Dragon Ball, Digimon, Navegantes da Lua e Inspetor Gadget. Mas tenho uns primos mais novos e eles veem bastante TV, por isso acabo por encontrar (sem ter o trabalho de procurar) reposições. Sorte minha, acho eu.
      Ah, acabei de me lembrar de quando postei aqui no blog que estavam a repor o programa Silvestre e Tweety ao Seu Dispor! Essa reposição eu encontrei completamente por sorte.

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    2. Sim oferta em demasia. É um dos maiores problemas atuais a meu ver, e deseja-se essa tal oferta como "direito" ou até "necessidade".
      Ignorando o teu exemplo irónico da fome, precisamente quando o Homem ou outro animal deseja "intensificar as suas emoções", citando-te, o raciocínio normal é sem dúvida fazer algo muito mais vezes, mas isto acaba por ter efeito contrário. Isto está muito relacionado com a sensação que se tem nas primeiras vezes, que são sempre as melhores (muitas vezes diz-se que convém trabalhar para alcançar a alegria em determinadas coisas, ora nestes casos eu aplico o mesmo pensamento, simplesmente para irmos mais de encontro ao que eu digo, reponho "convém trabalharmos em algo para alcançarmos uma primeira vez", convém ouvir repetidamente e perceber muito uma sinfonia de Mahler para a compreender verdadeiramente e consequentemente apreciá-la, ou convém dominar bastante treinando o Cálculo Diferencial e Integral para poder alcançar o prazer da magia dos números, são exemplos) e também inspiro-me em algo que por acaso já foi dito por outra pessoa, Nietszche dizia que (sem dúvida que também há boa dose de ironia aqui mas no ponto onde quero chegar acho que não) "as pessoas mais felizes são aquelas que têm menos memória", qualquer coisa assim do género, e eu realmente acho que a demasiada presença de algo na cabeça tira a magia das coisas, e às vezes não precisa de estar relacionado com o objeto apreciado, basta ver que precisamos de descansar, de nos libertarmos para apreciar qualquer coisa, e eu acho que (já que o desenho animado é visto como "lúdico" ou seja está no descanso) até devemos descansar para descansar, portanto devemos saber entreter-nos. Obviamente que esta é a minha opinião, não haja dúvida que vivendo num mundo onde a filosofia é o consumo, o desperdício, ter tudo de todo o mundo de modo a que jamais falte, por aí, tudo isto que eu disse não passa de estupidez.

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